Várias são as manifestações de violência que imperam na
sociedade e ao longo dos tempos. Ela configura-se em cada
momento social e exige novas respostas, visto que muda historicamente. Da
transposição desta realidade, existem inúmeros exemplos no cinema.
Do realizador Stanley Kubrick, o filme Laranja Mecânica deixa entrever surpreendentemente a discussão entre
violência, violação, sexo, destruição, morte. Alex DeLarge, protagonista, líder
de um pequeno grupo de arruaceiros, pratica atos criminosos como espancar um
mendigo, violar uma mulher e assassinar outra… Tudo realiza em tom trocista,
como num entretenimento, até ao momento em que, traído pelos membros de seu
gangue, é preso. A par de todas estas ações, consegue ainda dedicar-se à música
de Beethoven que escuta religiosamente. Em síntese, o filme trata da violência
juvenil e do tratamento imposto a Alex.
Seja como for, sob
todas as suas formas, na sociedade contemporânea, a violência desrespeita os
direitos fundamentais do ser humano, sem os quais o homem deixa de ser
considerado como sujeito, de direitos e de deveres, e passa a ser olhado como
um puro e simples objeto. Talvez seria esta a forma da personagem, Alex,
encarar o outro.
Forma de violência é, por exemplo, o
processo educacional que organiza condutas e pensamentos, através da moral, de
regras e normas, de modo a civilizar o sujeito para sua própria preservação e
convívio coletivo. Associa-se a esta, em várias circunstâncias, a violência da
Igreja (qualquer que seja a opção religiosa), na medida em que, baseada na
ideia do pecado original, impõe, limita uniformiza comportamentos humanos. A violência exercida
pela cultura dos media é visível na exploração
de inúmeras situações sociais com o único objetivo de captar a atenção do público.
A violência doméstica, mais visível nos
dias de hoje, é também ela expressão de atos hediondos que a humanidade pratica
contra crianças/adolescentes, mulheres, idosos e encontra-se profundamente
associada ao contexto histórico, social, cultural e político em que se insere
cada vítima e seu agressor. Destaca-se, neste âmbito, ações de violência física
e/ou psicológica, de negligência (omissão de responsabilidade, por exemplo, dos
pais para com os filhos), de violência sexual (práticas sexuais, recorrendo à força
física, à influência psicológica, ao uso de armas e/ou drogas). A violência
doméstica, nas suas diversas formas, configura padrões abusivos entre os
envolvidos. A violência contra a mulher parece socialmente aceite, quando se
assiste a elevados níveis de tolerância para com tais manifestações de agressividade.
Que respostas encontramos contra abusos, violações, maus
tratos, humilhações e outras expressões de violência? Em muitos casos,
assistimos à devolução dessa violência como se houvesse uma mais questionável
do que outra. O facto é que há momentos em que os valores defendidos ora são
coniventes ora condenam comportamentos, mas em pouco se sobrepõem aos instintos
humanos. Convocando, de novo, “Laranja mecânica”, este é o exemplo da
ineficácia do “Tratamento Ludovico”, da lavagem cerebral em vítimas indefesas
(sociedade) ou com consentimento (Alex), com vista à obediência ao Estado. Esta
circunstância explica o título
do filme o qual mostra que a restrição da
liberdade de escolha transforma os humanos em máquinas, que o lado sensível do
ser humano é transformado num mecanismo automático e determinista. A tendência
de Alex para o mal é vista como inata, algo mecanicista, porque apesar de
extrair satisfação da prática de atos violentos, estes são concretizados de um
modo reflexivo.
Em boa verdade, em qualquer momento da História da
Humanidade, o ser humano convive(u), diariamente, com a violência nas suas
diversas expressões: física, psicológica, simbólica… Impõe-se, portanto, uma posição, de cada sujeito, frente
à multiplicidade de atos de agressividade, que conduza à transformação, pelo
seu interior, da sociedade.
Bruno Oliveira